A destruição de uma cidade

A destruição de uma cidade

Uma triste observação que qualquer paulistano pode fazer ao visitar os lugares históricos de sua cidade, é que eles estão em ruínas. É um caos: igrejas depredadas e caindo aos pedaços, largos cheios de indigentes violentos viciados em drogas e prédios pichados.

É possível observar na história de São Paulo três momentos. O primeiro foi a vila, quando os jesuítas fundaram-na no Pateo do Collegio, em 25 de janeiro de 1554, no planalto de Piratininga. A segunda é com os bandeirantes, a elevação à cidade e o crescimento por causa do café. A terceira é da metade do século passado até hoje.

Esta vila, São Paulo dos Campos de Piratininga, era pobre, e se parecia com uma pequena vila portuguesa. Demorou para crescer e deixar de ser pobre, pois foi ofuscada por outras vilas, como Santos, e eventos, como a descoberta de ouro em Minas Gerais. Em 1625, tinha cerca de 750 habitantes.

Conforme São Paulo foi enriquecendo, no século XVIII, com as bandeiras, a pequena vila foi crescendo, perdendo o “dos Campos de Piratininga”, se tornando capital da Capitania de São Paulo e Minas de Ouro em 1709, e elevada à cidade em 1711.

Em 1822, Dom Pedro I proclamou a Independência do Brasil, no rio Ipiranga, quando ele ficava à cinco quilômetros de São Paulo. Em 1823, Dom Pedro concederia o título de “Imperial cidade” para São Paulo.

No período imperial, a cidade ganharia mais importância, com o crescimento do café na região, a construção de uma ferrovia que ia de Santos até Jundaí, e, no fim do século XIX, a imigração, especialmente de italianos.

A cidade não estava conseguindo suportar tanto crescimento populacional. As igrejas, ruas e estabelecimentos começaram a ficar pequenos para tantas pessoas, e não condiziam com a preponderância da cidade. Iniciou-se então um processo de demolir as antigas construções para erguer novas, inspiradas nas capitais europeias, muito inspiradas pela Belle Époque.

O fotógrafo carioca Militão de Azevedo conseguiu registrar esta transição das construções da vila de São Paulo para as da cidade, no “Álbum Comparativo da Cidade de São Paulo 1862–1887”.

Muitas igrejas foram demolidas para dar lugar a maiores, como a antiga Catedral de São Paulo, abadia do Mosteiro de São Bento, Igreja da Consolação, e muitas outras. Algumas foram demolidas para nunca mais serem reconstruídas, como a Igreja de São Pedro e a Igreja do Rosário.

Outro fotógrafo, Washington Luís Pereira de Souza, tirou outras fotos comparativas, de 1900, 1910 e 1916.

Teto da Cathedral (A conversão de S. Paulo) — Tela de Almeida J°.
Igreja da Consolação
Igreja do Rosário
Mosteiro de S. Bento

Neste período, o centro de São Paulo estava sendo reconstruída em um estilo europeu, inspirado na Art nouveau, na arquitetura eclética e clássica, se assemelhando as grandes cidades da Europa durante a Belle Époque. Também chegavam os imigrantes, especialmente italianos, que iam viver nas periferias de São Paulo, como a Barra Funda, Brás, Bixiga, Lapa, Pompeia e Vila Romana.

Muitos destes bairros, que eram periféricos até décadas atrás, foram “enobrecidos”, e estão sendo demolidos para se transformarem em um reduto de caixas de fósforo de concreto, por serem próximos do centro, mas não estarem na mesma situação que ele (tomado por drogados).

É possível demonstrar o quão periféricos estes bairros eram, pegando o exemplo da Vila Romana e da Pompeia, bairros de imigração italiana, que foram populados por operários das fábricas do Matarazzo. Quando a Igreja da Praça Cornélia foi inaugurada, em 1932, somente uma das ruas que a cortava era pavimentada. Enquanto isso, no centro, em 1934, foi terminada a construção do Edifício Martinelli, o primeiro arranha-céu da cidade.

Paróquia São João Maria Vianney em 1944, como mostrado em um documentário americano sobre o Brasil
Paróquia São João Maria Vianney, 12 de abril de 2023

Hoje em dia, vários prédios estão sendo erguidos no bairro, destruindo as casas tradicionais construídas pelos imigrantes. Não é incomum que empresários comprem um bairro inteiro, somente para demolirem-no e erguer várias torres.

Nos últimos vinte anos, o centro de São Paulo passa por uma crise gigantesca. A prostituição e tráfico de drogas se desenvolveram no centro há muitas décadas, porém, nas últimas duas, o centro foi dominado por usuários de crack, uma droga da qual a recuperação é muito rara, e que atacam qualquer um de aparência fraca em busca de objetos de valor para trocarem pela droga.

Por isso e algumas outras razões, os bairros do centro se tornaram quase exclusivamente comerciais, agravando mais ainda a situação, já que o único movimento que existe lá é por conta do comércio, que fecha às 17:00h e não abre de feriados e finais de semana.

A prefeitura mostra um grande descaso com as igrejas e prédios históricos do centro, deixando-os deteriorar, seja por ação natural, ou por intervenção de vândalos, que picham e desrespeitam até os templos de Deus.

Largo Pateo do Colégio, onde começou São Paulo
Lateral da Abadia do Mosteiro de São Bento, com uma efígie de Leão XIII
Paróquia Matriz Nossa Senhora da Conceição (Santa Ifigênia)
Largo de São Bento
Afresco de São Francisco descoberto com a reforma (parada) da Igreja de Santo Antônio, a mais antiga de São Paulo, anterior de 1592
Theatro Municipal
Parte de dentro da entrada da Igreja de Nossa Senhora da Consolação
Afresco de Santo Antônio na Igreja de Nossa Senhora da Consolação
Altar de São Benedito na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos
Vitral quebrado de São Jorge na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos
Teto deteriorado da capela do Santíssimo Sacramento da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos

Infelizmente, é certo que essa deterioração continuará, já que o governo é omisso com prédios que mostram a origem católica da cidade e do país, mas não com construções brutalistas e obras modernistas sem sentido. São Paulo poderia ser uma grande cidade aos moldes da Belle Époque, mas no meio do caminho escolheram transformá-la em uma horrorosa cidade aos moldes ianques.

Bruno,
São Paulo dos Campos de Piratininga, Terra de Vera Cruz, 12 de junho de 2023, 523º do descobrimento e 201º da Independência.